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Conteúdo anterior Anterior Dos Sacramentos e dos DeveresDurante algum tempo, trabalhei na enfermaria de ortopedia, onde estavam senhoras idosas com fraturas nas ancas e nas pernas. As mais novas tinham mais de 60 anos. Aproximavam-se da terceira idade quando tinham 80 anos e, passados os 95 anos, admitiam então que estavam velhas. A princípio, achei estranho chamá-las pelos seus nomes próprios, mas era o costume do hospital e rapidamente me habituei.Essa enfermaria deu cabo de mim, porque o trabalho era muito pesado. Havia uma mulher com barba e sem peito, e as enfermeiras falavam dela disfarçadamente, dizendo que era uma aberração. Tinha um péssimo temperamento, atirava coisas às enfermeiras e os seus hábitos eram imundos, pelo que precisava constantemente de ser limpa. Era um autêntico castigo tratar dela.Tinha de cerrar os dentes e suster a respiração enquanto a lavava, para controlar a minha aversão.Trabalhar nessa enfermaria foi a parte mais dura do meu trabalho no hospital. Uma tarde, quando tinha estado a limpar durante todo o dia e a malvada paciente atirou novamente o seu bacio para o chão, sujando os meus sapatos e as minhas meias, deixei a enfermaria lavada em lágrimas e sentei-me na casa de banho a chorar descontroladamente pela fealdade e miséria da vida. Não consegui parar de chorar durante tempo suficiente para ir avisar a menina Adams, para que as minhas pacientes não ficassem sozinhas, e fiz uma coisa imperdoável: fugi para o meu quarto, onde continuei a chorar. Vou lembrar-me sempre da amabilidade com que a enfermeira-chefe veio ter comigo e me falou das responsabilidades das enfermeiras e da dignidade da sua profissão, bem como do «sacramento do dever». Jamais esqueci essa expressão.Conteúdo seguinte Seguinte Da Teologia e do Futuro Como apontou Philip Jenkins, no seu clássico «A Terceira Igreja», vivemos hoje um momento de profunda transformação na história das religiões, uma mudança silenciosa que o Cristianismo vive já desde o século passado, com a impetuosa deslocação para sul do seu centro de gravidade: África, América Latina, Ásia. Trata-se de uma tendência, com toda a probabilidade, destinada a tornar-se ainda mais visível (e de que maneira!), nas próximas décadas: o Cristianismo deverá passar por um verdadeiro boom mundial, ainda que a grande maioria dos crentes não seja nessa altura já branca nem europeia, nem euro-americana. Pelo contrário, especula o autor, com base nas projeções estatísticas já disponíveis: em 2050, apenas um quinto dos potenciais três mil milhões de cristãos (pertencentes a diferentes confissões, entretanto cada vez mais homologadas) será constituído por brancos não hispânicos. Ainda assim, com meritórias excepções, as igrejas cristãs do Hemisfério Sul permanecem practicamente invisíveis aos olhos dos observadores do Norte: isto para já não falar na conhecida tese do cientista político Samuel P. Huntington, que no seu best-seller que fundou, na corrente vulgata, a teoria do "choque entre civilizações", «O choque das civilizações e a nova ordem mundial» – que se refere comummente ao Cristianismo como um fenómeno ocidental. A descrição que Jenkins faz desse Cristianismo do futuro – obviamente hipotética, mas não sem fundamento – é intrigante: substancialmente pobre do ponto de vista económico, conservador na fé, na doutrina e na moral, e completamente orientado para o sobrenatural. Carismáticos, apocalípticos, visionários, seduzidos por curas, exorcismos e visões oníricas, infectados pela literalidade das Escrituras, os cristãos de amanhã deverão ser em grande medida pentecostais (os quais, por sua vez, considerando a versão evangélica original e a sua correspondente católica, representariam já hoje, segundo estimativas plausíveis, um quarto dos cristão espalhados pelo planeta.